Com a chegada do
natal e das confraternizações de final de ano, temos em nossa cultura o hábito
de presentearmos uns aos outros, principalmente as crianças com a ideia de
Papai Noel. Assim aprendem que natal é sinônimo presentes. De modo que não são
incomuns as listas quilométricas de solicitação de presentes – as quais os pais
acabam tendo que driblar as exigências dos filhos.
Agora é o tempo
propício para refletir sobre como o consumismo na infância e como tem permeado
nossa cultura e dominado um cenário onde o “ter” é mais importante do que o “ser”.
As crianças são vistas pela mídia como potentes consumidores e sido alvo de
propagandas avassaladoras na apreensão do desejo. É construída a ideia de que
criança feliz é aquela que tem muitos brinquedos; pais bons são os que
conseguem dar tudo o que os seus filhos querem, mesmo que à custa de
esgotamento no trabalho e sacrifícios na vida financeira da família.
Que lugar o
consumismo ocupa nas famílias contemporâneas? Será que muitas vezes a compra de
brinquedos serve como um "tapa buraco" emocional? Suprir ausências?
Ou única e precária forma que sabemos demonstrar afeto?
É possível perceber
que grande parcela das crianças já tem brinquedos demais, cômodos abarrotados
de objetos de entretenimento que já não são usados há muito tempo. E ter
brinquedos não significa brincar. A propósito, brinquedo em excesso pode
significar falta de espaço para brincar. Paradoxalmente, em meio a tantos
entretenimentos, vemos também uma geração de crianças prostradas, isoladas,
viciadas em seus eletrônicos e desmotivadas para brincar livremente, beirando a
apatia e ao tédio.
Na contramão da
tendência atual, o livre brincar é uma atividade bastante desejável para o bom
desenvolvimento da criança. Aparentemente simples e natural, não precisa de
brinquedos estruturados, insubstituíveis e caros para sua execução. É livre de
regras, imposições e estímulos intencionalmente educativos. Qualquer objeto que
lhe capture a capacidade imaginativa e a espontaneidade é o suficiente para uma
experiência extremamente enriquecedora e prazerosa.
Outro ponto
importante é lembrar que brinquedo nunca é apenas um brinquedo, mas carrega em
si uma série de construção social e emocional, pois ensina à criança aquilo que
a sociedade quer que seja aprendido – valores, regras e condicionamentos. Temos
como forte exemplo a aquisição de brinquedos que reforçam o próprio consumo, de
pertencimento a determinado grupo e que expressam as polêmicas relações
sexistas.
No fundo, os
pequenos querem e precisam bem mais de momentos de qualidade com a família e os
amigos, onde eles recebam atenção e interação e não necessariamente brinquedos.
O melhor presente, em qualquer data do ano é sempre a presença dos pais e
demais representantes de amor e vínculo.
Trabalhar com a
criança valores que a protejam de uma visão consumista e depredatória do mundo
é uma importante missão ligada à educação doméstica e escolar. No entanto, o
consumismo infantil vai muito além destas esferas, sendo também um problema de
ordem ético-econômica, social e ambiental, do qual somos todos responsáveis e
potentes agentes transformadores.
Assim, nós adultos,
mesmo imersos nesse contexto cultural desfavorável, temos a capacidade de
reflexão e consciência crítica para que com responsabilidade possamos ensinar
as crianças a diferenciar NECESSIDADE de DESEJO, participar com elas das feiras
de troca, incentivar a doação de brinquedos, falar sobre as desigualdades
sociais, as condições de trabalho das pessoas que fabricam esses brinquedos e
as limitações de renda da própria família. Esses podem e devem ser assuntos
tratados com crianças, desde que obviamente adequando-se à compreensão de cada
idade.
É através do
cotidiano que se faz a diferença, conversando a cada oportunidade sobre o
acúmulo de objetos e o desapego. E assim construir nelas a noção de que as
pessoas são mais importantes do que as coisas e muni-las com um modo de vida
mais sustentável, maduro e menos vulnerável às amargas exigências do capital
para serem felizes.
Micheli Krayevski
Eckel
Psicologa CRP
12/8587
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