Muitos acham graça quando crianças falam que têm namorados, trocam beijinhos e declarações de amor. Os pais apresentam seus filhos de poucos meses de vida como ótimos pretendentes para os pequenos filhos dos amigos; o pai festeja o menino que será pegador; a mãe vibra com as meninas que destruirão corações; vídeos de crianças apaixonadas circulam encantando os internautas. O que fica na cabecinha de quem ouve ou protagoniza esse tipo de coisa? Será que essa brincadeira (aparentemente inocente) não está lançando a infância em um terreno adulto demais?
É papel dos pais separar para seus filhos o que é do mundo adulto e do mundo infantil, e não misturar tudo – como muitos vêm fazendo. Não é à toa que cada vez mais cedo, meninos e meninas com 12 anos de idade ou muito menos “ficam” com os colegas da escola ou vizinhos como se fossem adolescentes. E mães de crianças com cinco anos levam um susto quando pegam as filhas beijando uma amiguinha na boca, em uma brincadeira onde a Barbie namorando já não é mais suficiente.
A indústria de roupas e cosméticos investe na “adultização” da infância, e este mercado vai crescendo às custas dos anos roubados das crianças. O problema é que os adultos, principalmente os pais, não percebem a seriedade do problema e caem na armadilha, estimulando o atropelo das brincadeiras, com atividades que incentivam os namoricos de mentirinha e conduzem a uma verdade preocupante: a erotização precoce.
O namoro é a vivência da sexualidade, da atração pelo corpo do outro, portanto, não é assunto de criança. Apenas na adolescência, o corpo começa a sofrer transformações que os levarão a um corpo adulto e maturidade emocional para a vida de casal. Antes disso, qualquer iniciativa para erotizar as relações ou fantasias infantis devem ser evitadas. O que os pais e a sociedade falam promove mudanças precoces interferindo negativamente no desenvolvimento infantil.
As afirmações dos pais sobre namoros entre crianças funcionam como o consumo de produtos para adultos na infância. A mãe que compra um sutiã de bojo para a filha de 8 anos pode estar buscando resolver, por intermédio do corpo da criança, as dificuldades com a própria sexualidade. Em geral, cria-se um movimento de fusão entre as duas (identidade e matriz). A filha funciona como um cabide da sexualidade da mãe. É um movimento inconsciente! Pais que têm uma vida sexual reprimida ou insatisfatória vivem a sexualidade pelo prazer dos filhos. Quanto mais comprometida estiver a vida sexual, mais vacilaram.
A atitude dos pais deve ser de provocar as crianças para pensarem em outras coisas. Não se deve jogar luz, valorizar, dizendo coisas como: “O meu filho é macho, já está beijando”. As crianças precisam ser estimuladas a viver em sociedade, sem foco na sexualidade, mas sim usufruindo o melhor que esta fase pode lhe proporcionar.
A sexualidade vivenciada de maneira precoce e distorcida afasta a criança daquilo que é próprio da idade, como o aprendizado escolar. A criança precisa estar com a sexualidade adormecida, com o foco fora do seu próprio corpo, para poder enxergar o mundo. Ou foca a energia para a sexualidade ou para o aprendizado. Mais tarde, quando já teve tempo para aprender o que é básico das letras e dos números, tem energia para viver com as duas coisas ao mesmo tempo. Além de problemas de sexualidade precoce, terá mais dificuldade no aprendizado escolar.
Os pais não podem ter medo de ser careta, é necessário dizer: “Isso não é coisa de criança. Você só vai beijar e namorar quando crescer”.
Micheli Krayevski
chelykrayevski@gmail.com
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